Bastou o Ministério da Educação divulgar o tema da redação do Enem deste ano no Twitter para que as redes sociais fossem tomadas por manifestações elogiosas por um lado e agressivas pelo outro. Por incrível que pareça, falar sobre a persistência da violência contra a mulher no Brasil não foi considerado importante ou válido por todo mundo.
No primeiro dia de provas, uma questão sobre o feminismo também já havia causado polêmica. Para quem acompanha as interações na rede, nenhuma novidade. O professor da Universidade Federal do Espírito (Ufes), Santo Fábio Malini, diz que os movimentos em defesa dos direitos humanos são vistos de maneira muito pejorativa na internet. E ele acredita que a instabilidade política do país tem ajudado os discursos de ódio a ganharem fôlego, assim como a falta de mediação em espaços onde é possível maior controle.
Dentro do Laboratório de Estudos em Imagem e Cibercultura da Ufes, Malini coordena a elaboração de um aplicativo que vai filtrar em tempo real postagens públicas feitas no Facebook, no Twitter e no Instagram relacionadas a quatro temas: mulheres, indígenas população negra e LGBT's. O Monitor de Direitos Humanos deve estar disponível para uso público a partir do próximo dia 20 de novembro.
O nome da professora universitária e blogueira feminista, Lola Aronovich, deve aparecer com alguma frequência. Desde que lançou seu blog na internet há oito anos, Lola conquistou milhares de leitores mas também enfrenta agressões ameaças de morte já viu seus dados pessoais divulgados e páginas serem criadas apenas para atacá-la. Apesar de tudo, Lola acredita que vale a pena denunciar a atividade dos chamados grupos masculinistas, que usam a internet para disseminar o ódio contra as mulheres. Especialmente após o episódio do massacre de Realengo em 2011, quando Wellington Menezes entrou atirando em uma escola do Rio de Janeiro, matando 12 estudantes, sendo dez meninas.
Mas, mesmo quem não é ativista corre o risco de ser vítima de ataques na internet. Para a jovem Maria das Dores Martins dos Reis, bastou ser negra e postar uma foto no Facebook ao lado de seu namorado, que é branco. A foto recebeu centenas de comentários racistas e foi compartilhada em grupos criados especialmente para agredir Maria das Dores.
O caso da jovem chegou a ser investigado pela polícia, mas hoje, mais de um ano depois, Maria das Dores ainda não viu seus agressores serem punidos. A coordenadora do Núcleo Contra a Desigualdade Racial da Defensoria Pública do Rio, Lívia Casseres, lamenta que a impunidade seja comum, mesmo em casos de racismo, crime previsto pela legislação brasileira. Diante da leniência ou da morosidade da justiça criminal, a defensoria tem buscado outras saídas.
O monitor de direitos humanos é um projeto encomendado ao laboratório da Ufes pela Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, que hoje integra o Ministério das Mulheres, Igualdade Racial e Direitos Humanos. Os dados coletados pelo aplicativo não são encaminhados diretamente para nenhum órgão, mas podem ser usados para quem queira denunciar crimes de ódio ao Programa Humaniza Redes ou mesmo à Polícia Federal.





